"Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas."
Devo reconhecer, essa frase está presente em um dos momentos mais emocionantes e marcantes da leitura do livro, provavelmente, então, por isso ser tão citada. Entretanto, imaginar que uma obra tão profunda e tão mais densa pode ser citada "apenas" por isso, é um engano dramático.

Assim que ela terminou de ler, ela veio pra mim, quase aos prantos, e me disse pra ler aquele livro, pois era uma lição de vida. Depois, ela deve ter insistido, e eu, criança teimosa que devia ser, nunca toquei no livro. Grandessíssimo erro meu. Hoje, gostaria de ter lido àquela época, para que, quando tivesse lido novamente agora, poder comparar o que eu teria pensado então. De qualquer maneira, não é o tipo de arrependimento que vai me matar.
Esses dias, depois de alguns conselhos, decidi ler o livro. "Minha mãe tava certa", foi o que me passou pela cabeça depois de ler a primeira página.
O Pequeno Príncipe é uma espetacular e simples metáfora sobre a natureza humana em si. Incrivelmente cheio de sutilezas e subjetividade, a história faz você pensar e se descobrir consciente ou inconscientemente, de modo que, como minha mãe disse, é uma lição de vida: você não vai ser o mesmo quando terminar esse pequeníssimo e simples livro.
Infelizmente, eu não posso tratar de todas as pequenas sutilezas no post unicamente; terei, então, de ser o mais suscinto possível. Mas não deixem de se utilizar dos comentários para (bom, comentar) discutir outros elementos não citados ou pouco desenvolvidos.
É difícil explicar o enredo d'O Pequeno Príncipe. Entretanto, farei uma tentativa. Sendo simplista por demasia, o livro narra o encontro entre o Pequeno Príncipe e um aviador - o Narrador, que após algum problema no avião, pousa no deserto do Sahara.

Essa experiência remete a um texto de Theodor Adorno e Max Horkheimer, que compara a inteligência à antena de um caracol. Um caracol se guia unicamente pela antena, e quando tateia algo em seu caminho, se esconde e espera, até ter coragem de pôr as antenas para fora novamente. E, caso ainda haja esse algo, volta a se esconder, e passa ainda mais tempo escondido.
Tendo isso em vista, é possível, então, entender a metáfora global da história: o deserto é nossa própria mente. O tempo que o Narrador passa com o Pequeno Príncipe é uma jornada de auto-descobrimento, e a água que o Narrador, angustiado, teme acabar, é a sua satisfação espiritual. Mas, e o Príncipe?

O diálogo de despedida entre ela e o Príncipe é notável, mas gostaria de citar outra passagem, aqui.
"Não a devia ter escutado - confessou-me um dia - não se deve nunca escutar as flores. Basta olhá-las, aspirar o perfume. A minha embalsamava o planeta, mas eu não me contentava com isso. A tal história das garras, que tanto me agastara, me devia ter enternecido. Confessou-me ainda: "Não soube compreender coisa alguma! Devia tê-la julgado pelos atos, não pelas palavras. Ela me perfumava, me iluminava ... Não devia jamais ter fugido. Deveria ter-lhe adivinhado a ternura sob os seus pobres ardis. São tão contraditórias as flores! Mas eu era jovem demais para saber amar."
"A tal história das garras" se refere à flor ser dizer não temer tigres ou grandes animais, já que possui quatro espinhos; o que nos chama atenção, já que, tão suscetível ao vento, por exemplo, a flor não teme tigres.
Assim, o Pequeno Príncipe sai por alguns planetas e encontra alguns adultos: o Rei, o Vaidoso, o Bêbado, o Homem de Negócios, o Acendedor de Lampiões e o Geógrafo. Cada um com suas peculiaridades revelam as facetas paradoxais e desprovidas de sentido do bom adulto. Cada um dos diálogos é muito interessante e nos afeta profundamente, nos levando a uma introspecção profunda.
Por último, Príncipe chega na Terra, onde encontra o Narrador, perdido no deserto.

E o Príncipe, então, sobe em uma montanha, esperando encontrar homens. Ao falar, escuta apenas o eco das montanhas e acha que "(...) os homens não têm imaginação. Repetem o que a gente diz (...)". O que prova que mesmo o Príncipe, tão virtuoso, é capaz de tomar conclusões tão apressadas - e, que, apesar disso, condiz com o comportamento de alguns dos adultos que ele encontrou previamente. Abstratamente, é a mistura de um meta-Narciso com um anti-Narciso.
Chegamos, então, à parte mais citada do livro. O Príncipe, ao caminhar pelo deserto, encontra um jardim repleto de rosas, iguais àquela que ele tanto ama e deixou em seu planeta, e fica profundamente desapontado, por sua flor ter dito que era única. Ele, então, encontra a Raposa.
A Raposa aparece inexplicavelmente, quase como uma epifania. Ela simboliza a sabedoria e entende como as coisas são na Terra, e as explica para o Príncipe. A Raposa fala sobre os caçadores, e sobre galinhas.
"- Minha vida é monótona. Eu caço as galinhas e os homens me caçam. Todas as galinhas se parecem e todos os homens se parecem também."

E, então, a Raposa explica ao Príncipe sobre cativar as pessoas, e sobre as sutilezas que os olhos não vêem. E como sobre, a partir de então, as pessoas não são só outras pessoas. É uma das passagens mais emocionantes do livro, de fato, e é a culminância de todos os sentimentos e a explicação de todos os anseios do Príncipe. É então que a Raposa profere as duas frases mais citadas:
"O essencial é invisível para os olhos."
"Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas."
Não desmereço de forma alguma, quaisquer uma dessas citações. Todavia, preciso alertá-los com veemência de que nenhuma das duas, nem as duas juntas, conseguem carregar, nem de longe, o sentido e o sentimento que o diálogo inteiro - junto com o entendimento de toda a história - transmite.
Em um breve e importantíssimo capítulo, o Príncipe encontra um vendedor de pílulas que matavam a sede, e segundo o vendedor, "os peritos calcularam: a gente ganha cinqüenta e três minutos por semana.". Ao que o Príncipe responde:
"- E que se faz, então, com os cinqüenta e três minutos? - O que a gente quiser... “Eu, pensou o principezinho, se tivesse cinqüenta e três minutos para gastar, iria caminhando passo a passo, mãos no bolso, na direção de uma fonte...”
Como eu disse, a sede é espiritual. Essa passagem faz uma crítica à mente moderna, quando tenta aplacar a sede espiritual e "ganhar tempo". Uma crítica comparável ao famoso "Deus está morto" nietzscheano, de igual poder metafórico. E, a resposta do Príncipe, que mostra ser o caminho tão importante - ou mais - que o fim.
Aí, então, o Príncipe entende, e volta para o Narrador, a fim de concluir sua jornada. Então, fica a cargo de vocês, lerem o livro, para descobrir e entender o final.

Novamente, gostaria de ressaltar que há inúmeras sutilezas e mensagens que eu decidi que não poderia abordar, como os baobás, o carneiro, a cobra, vários dos diálogos, mais sobre a dualidade adulto x criança, os planetas, entre outras coisas. Mas, novamente, sintam-se à vontade de se manifestar nos comentários.
"- Os homens de teu planeta cultivam cinco mil rosas num mesmo jardim... e não encontram o que procuram...
- E, no entanto, o que eles procuram poderia ser encontrado numa só rosa, ou num poço de água.
- Mas os olhos são cegos. É preciso ver com o coração...”
Referências:
http://www.overmundo.com.br/overblog/uma-breve-analise-sobre-o-pequeno-principe
http://www.sparknotes.com/lit/littleprince/
Por Eduardo Souza.